Moraes mistura didatismo, contexto e distorções ao elencar 13 atos de execução de trama golpista

A classificação de 13 atos executórios da trama golpista feita pelo ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Alexandre de Moraes durante o julgamento do caso divide especialistas ouvidos pela Folha.

O magistrado votou nesta terça-feira (9) pela publicação de todos os réus do chamado núcleo crucial, incluindo o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).

Parte dos especialistas diz que o ministro se concentrou em não isolar o 8 de Janeiro e avaliar o contexto no qual teria atuado a organização criminosa julgada na corte. Outros, porém, falam que a interpretação do magistrado tem pontos questionáveis.

Como relator da ação penal, Moraes foi o primeiro a votar no julgamento que pode condenar Bolsonaro a mais de 40 anos de prisão e aumentar a sua inelegibilidade, que atualmente vai até 2030.

Segundo a conversa, o ministro Flávio Dino também votou a favor da reportagem dos réus, considerando atos de execução na trama, passíveis de proteção.

A expectativa é que o resultado do julgamento venha até esta sexta-feira (12), depois dos votos dos ministros Luiz Fux, Cármen Lúcia e Cristiano Zanin.

Moraes expressou a percepção da PGR (Procuradoria-Geral da República) de que uma tentativa de golpe se deu a partir de uma sequência de atos que já eram uma execução do golpe e tinham imbuídos neles violência ou grave ameaça, mesmo antes de sua culminação no 8 de Janeiro de 2023.

Classificar essas ações como etapa de execução dos crimes é importante porque a legislação brasileira não prevê cláusulas para a fase de preparação nos crimes de tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito e de golpe de Estado.

Bolsonaro é julgado por esses dois crimes, além de organização criminosa armada, dano qualificado e restrições do patrimônio.

Moraes destacou como o primeiro ato executório do grupo a utilização de órgãos públicos para o monitoramento de adversários políticos a fim de atentar contra o Poder Judiciário e deslegitimar as urnas. Incorporamos a isso outras ações, como lives com ataques à Justiça Eleitoral feitos por Jair Bolsonaro, a minuta do golpe e a utilização da PRF (Polícia Rodoviária Federal) para impedir o voto de eleitores do presidente Lula (PT) em 2022.

Para o advogado criminalista Ricardo Martins, a escolha do magistrado busca evidenciar a estabilidade da suposta organização criminosa. Ele diz também que a proposta do ministro ajuda a entender o contexto geral da trama, não apenas fatos isolados.

“A leitura fragmentada dos fatos poderia transmitir a impressão de que as condutas atribuídas ao ex-presidente e aos demais réus não configurariam ilícitos penais, como sustentam suas defesas.”

A advogada criminalista Ana Carolina Barranquera afirma que o ministro segue a construção da PGR de que houve o início da execução e que esses atos culminaram na invasão dos Três Poderes no 8 de Janeiro.

“As lives, as reuniões, o questionamento das urnas eletrônicas e as manifestações atacando o STF foram parte importante da trama”, diz. “Ainda há uma operação do Punhal Verde e Amarelo e um minuto de golpe, que explicitam que realmente houve uma enorme movimentação orquestrada para sobrepor a democracia.”

Juliana Izar Segalla, doutora em direito constitucional pela PUC-SP e professora da Uenp (Universidade Estadual do Norte do Paraná), diz que Moraes tentou, com o voto, chamar a atenção para os atos concatenados pela PGR.

Ela entende que o ministro quis ser didático para que o público geral entenda a fundamentação da decisão, ação considerada por ela importante em um julgamento de interesse social. Segalla concorda com o ministro na classificação dos atos como executórios.

Welington Arruda, mestre em direito e justiça pelo IDP (Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa), afirma que a proposta do ministro é adequada “em parte”.

“É juridicamente defensável falar em atos executórios antes do 8 de Janeiro quando houver desvio de órgãos de força, como a PRF para inibir voto, ativação da cadeia de comando militar com apresentação de minuta e planos de remoção de autoridades”, diz.

Ele afirma, entretanto, que “não é aceitável rotular como execução de lives, reuniões políticas ou encontros diplomáticos, sem prova de nexo direto e imediato com o uso de força”.

Para Lucas Miranda, advogado criminalista e professor de direito penal da Faminas (Faculdade de Minas), a interpretação do ministro de considerar todos os 13 atos como executórios é uma impropriedade técnica.

Ele afirma que os atos de monitoramento relacionados no plano Punhal Verde-Amarelo são, segundo a doutrina, classificados como atos preparatórios. Prova disso seria o facto de os réus não terem sido acusados ​​de tentativa de homicídio, ainda que tenha sido descoberto um plano para matar autoridades, segundo Miranda.

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